A conferência Narrativas do Envelhecimento reuniu, esta quarta-feira, dia 6, no auditório da Reitoria da Universidade NOVA de Lisboa, uma casa cheia de interessados no tema para um momento de partilha e reflexão sobre o envelhecimento, cruzando pessoas e projetos numa abordagem abrangente e interdisciplinar.

Cláudio Soares, Pró-reitor para a área da Saúde na Universidade, abriu a sessão sublinhando a importância desta perspetiva holística: “O programa desta conferência é verdadeiramente multidisciplinar, indo dos aspetos moleculares do envelhecimento, os seus aspetos económicos, os aspetos sociais e o seu impacto na organização da sociedade, as intervenções médicas relacionadas com a pessoa idosa, as tecnologias presentes e futuras colocadas ao nosso alcance para nos adaptarmos ao envelhecimento, a prescrição social, a literatura e as narrativas.” No fim, e à semelhança do provérbio que diz “É preciso toda uma aldeia para educar uma criança”, defendeu que também poderíamos afirmar que “É preciso toda uma aldeia para lidar com o nosso envelhecimento. E a aldeia somos nós.”
Cruzar saberes para encontrar soluções
Organizada pelos Co-coordenadores do grupo NOVA Saúde dedicado ao Envelhecimento (Ana Paula Gil, da NOVA FCSH, Maria João Marques da ENSP, Sandra Tenreiro da NMS e Jaime Branco, também da NMS), um dos oito grupos da Plataforma NOVA Saúde, a conferência procurou dar visibilidade ao trabalho desenvolvido na NOVA sobre o envelhecimento, promovendo a troca de conhecimentos e o surgimento de sinergias entre docentes, investigadores e alunos das várias escolas e institutos, como salientado por Ana Paula Gil, em nome dos Co-Coordenadores do Grupo.

O primeiro painel focou-se nos processos de envelhecer, nos impactos e nos desafios emergentes. Ana Rita Pedro, investigadora da ENSP NOVA, apresentou uma das mais recentes estratégias para combater a solidão entre os idosos. “A Prescrição Social é uma ponte entre os cuidados de saúde e as soluções comunitárias já existentes – seja na promoção de estilos de vida mais saudáveis, no desenvolvimento pessoal ou na participação cultural, entre tantas outras”, frisou, salientando ainda a urgência destas soluções perante o cenário que temos: “24% da população tem 65 anos ou mais e um em cada quatro vive sozinho – sendo que, desses, entre 14% a 36% sente-se só.”

Ana Luísa Moraes, da NOVA FCSH, trouxe uma perspetiva literária ao debate, explorando o conto Mrs. Cross and Mrs. Kidd, de Alice Munro, para refletir sobre o impacto da institucionalização na identidade dos idosos. Defendeu que “o envelhecimento não tem de ser uma desvantagem” e destacou como a obra revela a necessidade de reconhecimento e a resistência silenciosa à ideia de que, com a idade, as pessoas se tornam invisíveis. Concluiu sublinhando o papel da literatura como “uma ferramenta poderosa para iluminar os desafios sociais e psicológicos do envelhecimento.”
Longevidade, cuidados e final de vida
O segundo painel abordou os aspetos económicos e sociais da longevidade. Apresentando o trabalho feito em coautoria com Pedro Pita Barros, Carolina Santos (Nova SBE) revelou alguns dados sobre os impactos económicos do envelhecimento em Portugal.

Perante uma distinção essencial – “Longevidade é o aumento da esperança média de vida; envelhecimento é a forma como lidamos com esse processo” – deixou um alerta para os desafios que enfrentamos como um dos países mais envelhecidos da União Europeia: “O que vemos é que a população mais velha enfrenta maiores dificuldades no acesso a cuidados de saúde“. Além disso, sublinhou, apontou novamente a solidão como um fator crítico: “o seu impacto na saúde das pessoas é equiparável ao de um cancro”.

Seguiu-se Matilde Gonçalves, da NOVA FCSH, com a apresentação Escola da Palavra: (re)significar a vida através da palavra. A investigadora começou por partilhar uma memória pessoal – mostrando uma fotografia do avô – enquanto contava como ele lhe ensinou a pescar trutas com folhas de abóbora. “Sem saber, ensinou-me a paciência, a resiliência, a observação e o cuidado”, sublinhou, para depois concluir: “As histórias e palavras dos mais velhos podem criar pontes entre passado, presente e futuro: têm muito para dizer, muito para nos ensinar.”
Inovação e desafios na saúde

O terceiro painel, “Desafios e avanços em torno da doença e do envelhecimento”, trouxe exemplos concretos de inovação. Diogo André Sequeira (da NMS) apresentou O saco contador de histórias, projeto finalista do último NOVA Impact Challenge, que permite a realização de tratamentos de diálise em casa. “Além do conforto que proporciona por não obrigar a deslocações, o saco terapêutico também conta uma história“, revelou, detalhando que pela análise médica do seu conteúdo é possível, depois, monitorizar a saúde daquele paciente.

Já Tatiana Burrinha (também da NOVA Medical School) falou sobre o envelhecimento neuronal e o risco de demência, destacando a importância da ciência na busca de soluções para atrasar o declínio cognitivo e transformar esse risco numa memória… distante.
Repensar o envelhecimento
A conferência terminou com a mesa-redonda “Inovar no envelhecer: Reflexões e novos rumos”, moderada por Ana Fernandes (ENSP) e com a participação de Carmen Garcia (enfermeira e colunista), António Fonseca (gerontopsicólogo), e Susana António (cofundadora da Associação A Avó Veio Trabalhar). Foi neste momento final que Jaime Branco, Co-coordenador do grupo de investigação em Envelhecimento da NOVA Saúde, fez um alerta sobre a estrutura do sistema de saúde: “O nosso sistema de saúde é absolutamente hospitalocêntrico.” Reforçando a necessidade de mais dignidade no final da vida, Carmen Garcia assinalou: “Tem de haver uma forma de morrer melhor do que numa cama de hospital.”