Conferência “Narrativas do Envelhecimento”: “É preciso olhar para o processo global e não reduzir tudo a um olhar médico, centrado na doença” 

7 de Fevereiro, 2025

A conferência Narrativas do Envelhecimento reuniu, esta quarta-feira, dia 6, no auditório da Reitoria da Universidade NOVA de Lisboa, uma casa cheia de interessados no tema para um momento de partilha e reflexão sobre o envelhecimento, cruzando pessoas e projetos numa abordagem abrangente e interdisciplinar. 

Cláudio Soares, Pró-reitor da NOVA para a área da Saúde

Cláudio Soares, Pró-reitor para a área da Saúde na Universidade, abriu a sessão sublinhando a importância desta perspetiva holística: “O programa desta conferência é verdadeiramente multidisciplinar, indo dos aspetos moleculares do envelhecimento, os seus aspetos económicos, os aspetos sociais e o seu impacto na organização da sociedade, as intervenções médicas relacionadas com a pessoa idosa, as tecnologias presentes e futuras colocadas ao nosso alcance para nos adaptarmos ao envelhecimento, a prescrição social, a literatura e as narrativas.” No fim, e à semelhança do provérbio que diz“É preciso toda uma aldeia para educar uma criança, defendeu que também poderíamos afirmar queÉ preciso toda uma aldeia para lidar com o nosso envelhecimento. E a aldeia somos nós.” 

Cruzar saberes para encontrar soluções 

Organizada pelos Co-coordenadores do grupo NOVA Saúde dedicado ao Envelhecimento (Ana Paula Gil, da NOVA FCSH, Maria João Marques da ENSP, Sandra Tenreiro da NMS e Jaime Branco, também da NMS), um dos oito grupos da PlataformaNOVA Saúde, a conferência procurou dar visibilidade ao trabalho desenvolvido na NOVA sobre o envelhecimento, promovendo a troca de conhecimentos e o surgimento de sinergias entre docentes, investigadores e alunos das várias escolas e institutos, como salientado por Ana Paula Gil, em nome dos Co-Coordenadores do Grupo.  

Ana Rita Pedro, da ENSP NOVA

O primeiro painel focou-se nos processos de envelhecer, nos impactos e nos desafios emergentes. Ana Rita Pedro, investigadora da ENSP NOVA, apresentou uma das mais recentes estratégias para combater a solidão entre os idosos. “A Prescrição Social é uma ponte entre os cuidados de saúde e as soluções comunitárias já existentes – seja na promoção de estilos de vida mais saudáveis, no desenvolvimento pessoal ou na participação cultural, entre tantas outras”, frisou, salientando ainda a urgência destas soluções perante o cenário que temos: “24% da população tem 65 anos ou mais e um em cada quatro vive sozinho – sendo que, desses, entre 14% a 36% sente-se só.” 

Ana Luísa Moraes, da NOVA FCSH

Ana Luísa Moraes, da NOVA FCSH, trouxe uma perspetiva literária ao debate, explorando o conto Mrs. Cross and Mrs. Kidd, de Alice Munro, para refletir sobre o impacto da institucionalização na identidade dos idosos. Defendeu que “o envelhecimento não tem de ser uma desvantagem” e destacou como a obra revela a necessidade de reconhecimento e a resistência silenciosa à ideia de que, com a idade, as pessoas se tornam invisíveis. Concluiu sublinhando o papel da literatura como “uma ferramenta poderosa para iluminar os desafios sociais e psicológicos do envelhecimento.” 

Longevidade, cuidados e final de vida 

O segundo painel abordou os aspetos económicos e sociais da longevidade. Apresentando o trabalho feito em coautoria com Pedro Pita Barros, Carolina Santos (Nova SBE) revelou alguns dados sobre os impactos económicos do envelhecimento em Portugal.

Carolina Pedro, da Nova SBE

Perante uma distinção essencial – “Longevidade é o aumento da esperança média de vida; envelhecimento é a forma como lidamos com esse processo” – deixou um alerta para os desafios que enfrentamos como um dos países mais envelhecidos da União Europeia: “O que vemos é que a população mais velha enfrenta maiores dificuldades no acesso a cuidados de saúde“. Além disso, sublinhou, apontou novamente a solidão como um fator crítico: “o seu impacto na saúde das pessoas é equiparável ao de um cancro”.  

Matilde Gonçalves, da NOVA FCSH

Seguiu-se Matilde Gonçalves, da NOVA FCSH, com a apresentação Escola da Palavra: (re)significar a vida através da palavra. A investigadora começou por partilhar uma memória pessoal – mostrando uma fotografia do avô – enquanto contava como ele lhe ensinou a pescar trutas com folhas de abóbora. “Sem saber, ensinou-me a paciência, a resiliência, a observação e o cuidado”, sublinhou, para depois concluir: “As histórias e palavras dos mais velhos podem criar pontes entre passado, presente e futuro: têm muito para dizer, muito para nos ensinar.” 

Inovação e desafios na saúde 

Diogo Sequeira, da NOVA Medical School

O terceiro painel, “Desafios e avanços em torno da doença e do envelhecimento”, trouxe exemplos concretos de inovação. Diogo André Sequeira (da NMS) apresentou O saco contador de histórias, projeto finalista do último NOVA Impact Challenge, que permite a realização de tratamentos de diálise em casa. “Além do conforto que proporciona por não obrigar a deslocações, o saco terapêutico também conta uma história“, revelou, detalhando que pela análise médica do seu conteúdo é possível, depois, monitorizar a saúde daquele paciente.  

Tatiana Burrinha, da NOVA Medical School

Já Tatiana Burrinha (também da NOVA Medical School) falou sobre o envelhecimento neuronal e o risco de demência, destacando a importância da ciência na busca de soluções para atrasar o declínio cognitivo e transformar esse risco numa memória… distante. 

Repensar o envelhecimento 

A conferência terminou com a mesa-redondaInovar no envelhecer: Reflexões e novos rumos, moderada por Ana Fernandes (ENSP) e com a participação de Carmen Garcia (enfermeira e colunista), António Fonseca (gerontopsicólogo), e Susana António (cofundadora da AssociaçãoA Avó Veio Trabalhar). Foi neste momento final que Jaime Branco, Co-coordenador do grupo de investigação em Envelhecimento da NOVA Saúde, fez um alerta sobre a estrutura do sistema de saúde: “O nosso sistema de saúde é absolutamente hospitalocêntrico.” Reforçando a necessidade de mais dignidade no final da vida, Carmen Garcia assinalou: “Tem de haver uma forma de morrer melhor do que numa cama de hospital.”