A Europa representa o maior mercado internacional de jogo online, com um Gross Gaming Revenue (GGR) que atingiu os 24,9 mil milhões de euros em 2020. Com efeito, o jogo online é uma indústria de grande importância em todos os países europeus, gerando milhares de milhões de euros em receitas para atores comerciais e governos. Apesar de tais efeitos evidentemente benéficos, o jogo online é, em última análise, uma vasta experiência social com consequências sociais e pessoais potencialmente desastrosas que podem resultar numa deterioração geral das relações sociais e familiares.
Em 2012, a Comissão Europeia divulgou um comunicado que destacava a necessidade de políticas regulatórias para ajudar na deteção de comportamentos patológicos de jogo, citando “uma responsabilidade de proteger os cidadãos e famílias que sofrem de uma adição ao jogo.” Em Portugal, o Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos é “responsável pelo controlo e regulação das atividades de jogo em casinos e salas de bingo, bem como de jogos e apostas online.” Esta autoridade recebe, diariamente, todos os dados relacionados com as atividades de jogo online (o montante de dinheiro gasto, os depósitos realizados, o número de eventos de login distintos, o número de minutos passados online, a hora de cada evento de acesso e o tipo de atividade de jogo selecionada (ou seja, máquinas de slots, poker, futebol ou outros eventos desportivos) realizadas por cada utilizador em cada plataforma online com serviços acessíveis a cidadãos portugueses. Apesar desta prodigiosa recolha de dados, a autoridade carecia de ferramentas adequadas para identificar viciados no jogo e reconhecia uma profunda escassez de dados acionáveis sobre o real alcance da adição ao jogo e uma consequente falta de especialização sobre a melhor forma de lidar com este problema.
Para resolver este problema, Mauro Castelli e a sua equipa da NOVA IMS desenvolveram e implementaram um sistema baseado em IA (Inteligência Artificial) que capitaliza a vasta quantidade de dados recolhidos diariamente pelos operadores de jogo online em Portugal e, a partir da sua análise, modela os comportamentos associados a jogadores viciados e permite a sua deteção precoce. A equipa propôs um sistema baseado em métodos de aprendizagem automática de última geração, incluindo, mas não se limitando, ao uso de algoritmos evolutivos e redes neurais profundas. O sistema proposto terá um efeito transformador nas operações da autoridade portuguesa de jogo. Em particular, o sistema permite comparar e caracterizar os comportamentos dos jogadores online e adaptar dinamicamente a sua predição com base no padrão comportamental observado diariamente para todos os utilizadores em Portugal.
O sistema proposto permitirá perceber quando um utilizador se aproxima de um comportamento “perigoso” (ou seja, indicando uma possível adição) e tomar medidas para proteger os cidadãos em risco de desenvolver uma adição grave, desenhando ações de prevenção.
Como resultado deste projeto, a equipa produziu 3 teses de doutoramento, 4 teses de mestrado, 32 publicações em revistas científicas e 22 publicações em conferências. Notavelmente, apesar de ter sido desenvolvido e testado em Portugal, seria possível estender a adoção do projeto a todos os países da UE onde existam as mesmas regulamentações relativas ao controlo das atividades de jogo. Em suma, o impacto social do projeto é enorme, dada a sua capacidade inerente de reduzir os custos socioeconómicos e de saúde associados à adição ao jogo.
Com este sistema, a autoridade de controlo de jogo pode efetivamente desempenhar o seu papel de controlo. Desta forma, pode proteger melhor os cidadãos dos efeitos prejudiciais do jogo patológico.
Mauro Castelli, 2023