Vozes recuperadas, novas questões: apagando os silêncios dos arquivos, construindo uma História plural

NOVA FCSH – Instituto de Estudos Medievais (IEM)

Investigador:

Maria de Lurdes Pereira Rosa

Principal Área Científica:

Ciências Sociais e Humanidades

Tipos de Impacto:

Academic, Cultural, Economic, Educational, Social, Fostering Open Science

ODS:

4, 8 and 16

Metas dos ODS:

4.4, 4.6, 4.7, 4.b, 4.c, 8.2, 8.3, 8.5, 8.9,16.6; 16.7, 16.a

“O programa ‘Arquivos de Família, Arquivos de Comunidade’ teve um impacto imediato na disponibilidade de arquivos preciosos anteriormente desconhecidos.”

“O programa ganhou escala internacional e resultou em bolsas de estudo de alto nível, nomeadamente nos EUA e na França, bem como em projetos de investigação, culminando numa bolsa do ERC.”

Ao contrário da situação na maioria dos países europeus, os arquivos de família em Portugal eram escassamente descritos e estudados, ou tinham uma expressão muito limitada em arquivos locais ou privados. Além disso, não eram utilizados em pesquisas históricas aprofundadas, nem estudados segundo parâmetros atualizados e interdisciplinares. A história sofria com essa ausência. O património arquivístico era desconhecido e ameaçado, e os Arquivistas Históricos eram desconhecidos em Portugal. A ausência de arquivos de família na construção de explicações históricas sobre o funcionamento da sociedade portuguesa pré-moderna levou a Professora Maria Pereira Rosa a criar, em 2008, um programa de investigação e ensino na NOVA FCSH – «Arquivos de Família, Arquivos de Comunidade: arquivos, história, património cultural».

O Programa nasceu de uma investigação de pós-doutoramento de âmbito principalmente científico e tinha como objetivo estudar um rico arquivo de família, que continha documentos a partir do século XIV. A investigação procurava abordar o problema de como alcançar a voz direta de indivíduos e famílias que viveram nesses séculos e que, na historiografia portuguesa, tinham sido principalmente estudados através dos arquivos da Coroa e da Igreja. Numa perspetiva mais ampla, pretendia entender como famílias e indivíduos se estruturavam numa sociedade corporativa, usando os seus próprios dispositivos para resistir e perdurar face às instituições mais fortes. No âmbito teórico, pretendia aplicar modelos não anacrónicos ao estudo da sociedade pré-Revolução Francesa, através da antropologia histórica.

Com o intuito de resolver estes problemas, a equipa da Prof. Maria de Lurdes Rosa descobriu uma grande quantidade de documentos inéditos, estudou-os em teses de mestrado e doutoramento; pesquisou dez novos arquivos, alguns com milhares de documentos; disponibilizou online inventários antigos (website INVENTARQ, online desde 2015) e publicou sete livros e mais de 30 artigos e capítulos de livros (website ARQFAM).

Além disso, a equipa da Prof. Maria de Lurdes Rosa trabalhou extensivamente em ações de divulgação. No projeto, foram recuperados documentos raros, disponibilizados e estudados – restauraram-se cinco documentos de enorme importância em arquivos privados ou públicos (dois em regiões periféricas – Madeira e Cabo Verde); e financiou a recuperação de milhares de fólios de documentos no Arquivo Regional da Madeira. A equipa realizou diversas ações de disseminação cultural – livro online DIY gratuito; artigos mensais sobre história local; exposições, cursos gratuitos, ações de formação, reuniões abertas; concurso escolar (2023). Foram publicados artigos em duas revistas semanais de destaque (Observador, 2020; Expresso, 2023) e em vários outros jornais, assim como um relatório na RTP Madeira. Além de investigadores e estudantes, os principais públicos-alvo/partes interessadas são proprietários de arquivos privados; arquivos públicos; comunidades locais – incluindo áreas periféricas e subdesenvolvidas.

Curiosamente, investigações anteriores da Prof. Maria de Lurdes Rosa e contactos esporádicos com proprietários de arquivos familiares indicavam a existência dos documentos, mas a relação desses proprietários com a academia era quase inexistente. O ponto de viragem veio com a inclusão dos proprietários de arquivos, como interlocutores diretos, nos primeiros encontros científicos do programa. A partir de 2009, realizaram-se encontros com proprietários de arquivos, historiadores e arquivistas, colaborando como pares para discutir problemas comuns. Ao longo dos anos, o programa ganhou reconhecimento internacional e impactou a sociedade (investigadores, estudantes, proprietários de arquivos privados, arquivos públicos e comunidades locais) através de: 1) encontros científicos; 2) ensino e orientação de cursos de doutoramento em universidades e instituições científicas no estrangeiro; 3) promoção de encontros de comunicação científica fomentando o conhecimento da história e do património local; 4) redação de manuais para o público em geral; 5) publicação de livros e artigos; 6) obtenção de financiamento científico público e patrocínios privados, nomeadamente bolsas de estudo de alto nível, nos EUA e na França, e uma bolsa ERC; 7) implementação de um novo doutoramento em Estudos Arquivísticos Históricos na NOVA FCSH, único na Europa; 8) presença nos meios de comunicação, com artigos publicados em duas revistas semanais de destaque e em vários outros jornais, bem como um relatório na RTP Madeira e um convite para apresentar resultados no Sustainable Value Creation Summit (NOVA.SBE, 2023); e 9) a presença nas comunidades locais. De facto, a investigação foi sempre acompanhada por ações de comunicação científica, fomentando o conhecimento da história e do património local (exposições na Torre do Tombo em 2016 e na Biblioteca Nacional em 2021-2022; iniciativa “Vínculo do mês”, agora com 30 edições, maioritariamente por proprietários de arquivos locais e historiadores).

No geral, o programa abriu caminhos de investigação, trouxe as vozes de protagonistas esquecidos e permitiu novas e plurais visões do passado. De forma pioneira, impactou profundamente o passado e o presente, e é objetivo dos investigadores que tenha um profundo impacto no futuro!

O trabalho de Maria de Lurdes Rosa na proteção de arquivos privados desde 2009 é altamente meritório: ela sensibilizou os proprietários de arquivos, organizou jornadas de estudo e conferências internacionais e publicou um manual sobre a proteção de arquivos familiares.

Christine Nougaret (Professora Emérita da École Nationale des Chartes (Paris), Diretora da Secção de Arquivos Privados nos Arquivos Nacionais de França de 1999 a 2006